O número de intoxicações por bebida adulterada registradas em setembro pelo Centro de Informação e Assistência Toxicológica (CIATOX) de Campinas bateu recorde. Foram somados nove casos de intoxicação, com dois deles resultando em cegueira no estado de São Paulo, além de mais dez pacientes sob investigação até o dia 25 deste mês. Especialistas alertam para o risco do consumo de bebida adulterada contaminadas por metanol, podendo causar cegueira e até levar à morte.

Desde o início de setembro, autoridades de São Paulo estão investigando casos de contaminação e mortes que estariam associadas ao consumo de bebidas adulteradas com metanol na região metropolitana da capital paulista. Há relatos de complicações graves, incluindo ao menos uma pessoa que perdeu completamente a visão após beber.

De acordo com o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, diretor executivo do Instituto Penido Burnier de Campinas, quando o metanol entra na corrente sanguínea, é transformado em ácido fórmico, uma substância altamente tóxica que diminui a oxigenação das células.

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“O nervo óptico funciona como um cabo que conecta a retina ao cérebro, onde as imagens são processadas. Se for danificado, a transmissão falha e a visão pode ser perdida”, explica o oftalmologista Claudio Lottenberg, presidente do Conselho Deliberativo do Einstein. “Ele é tão delicado que encostar a ponta de uma antena, por exemplo, já pode causar lesão irreversível.”

  • O que é metanol?

Estudos apontam que a ingestão de apenas 10 ml de metanol diluído em um litro de bebida é suficiente para causar lesões neuro-oftalmológicas, incluindo cegueira permanente. O consumo de 30 ml pode levar à morte.

O risco de perda da visão está relacionado à forma como o organismo processa essa substância. Quando o metanol é ingerido, ele é metabolizado pelo fígado e transformado em formaldeído e ácido fórmico, extremamente tóxicos. Esse último interfere diretamente na produção de energia das mitocôndrias, estruturas celulares fundamentais para o funcionamento das células nervosas do nervo óptico.

O especialista explica que a toxidade somada à falta de oxigênio atacam o nervo óptico, desencadeando a neurite óptica. Caso a doença não receba o tratamento adequado durante a fase inicial ou aguda, ela pode causar a perda irrecuperável da visão. Além do risco à visão, a intoxicação sistêmica causa sérios danos ao fígado, rim, coração, pâncreas e até alterações na camada externa do cérebro, podendo levar ao óbito.

Sinais de alerta e tratamento

O especialista diz que os sinais de alerta da intoxicação por metanol sempre indicam uma emergência médica, mas geralmente só surgem entre 12 e 24 horas após o consumo. Isso acontece porque o álcool etílico presente nas bebidas torna o metabolismo do metanol mais lento.

Os primeiros sintomas nos olhos são: visão turva, fotofobia e dor retrobulbar ou ao movimentar os olhos. Os sintomas sistêmicos mais frequentes incluem náusea, forte dor de cabeça, dor abdominal, vômitos e alteração da consciência.

As primeiras 48 horas são cruciais para salvar a visão e a vida após uma intoxicação por metanol. Diante da suspeita de ingestão de álcool adulterado, Queiroz Neto recomenda que a pessoa seja encaminhada a uma triagem no CIATOX para confirmar a acidose metabólica grave, que requer hemodiálise para eliminar o metanol da corrente sanguínea.

Outra terapia para casos menos graves de acidose é o fomepizol (também conhecido como 4-metilpirazol), um antídoto ao metanol. Para o inchaço causado pelo acúmulo de ácido fórmico no nervo óptico, o especialista indica o uso de corticosteroides para eliminar a inflamação.

Para prevenir a intoxicação por bebida adulterada, o especialista orienta sempre observar na garrafa o registro ANVISA, o lacre de segurança e o selo fiscal.

Quais os sintomas?

Os sintomas visuais associados à intoxicação por metanol não aparecem imediatamente. Eles podem surgir entre seis e 24 horas após a ingestão e, muitas vezes, começam com sinais confundidos com uma simples ressaca: tontura, fraqueza, náusea e dor de cabeça.

Com a progressão do quatro, a visão pode ficar embaçada, surgem manchas escuras (escotomas), maior sensibilidade à luz e até visão dupla. “O pior dos mundos é quando ocorre a perda progressiva da visão, como uma névoa que vai encobrindo tudo aos poucos”, relata o oftalmologista.

O diagnóstico do grau de lesão do nervo óptico envolve exames como a acuidade visual, que mede a capacidade de enxergar detalhes; a avaliação do campo visual, que verifica a visão periférica ou “de canto de olho”; e testes de resposta da pupila à luz e percepção de cores.

Além de provocar danos irreversíveis ao nervo óptico, o ácido fórmico também pode afetar outras áreas do sistema nervoso central e causar acidose metabólica grave (acúmulo de ácido no organismo), levando a perda de consciência, coma e até morte.

Atendimento médico imediato é fundamental para tentar conter os danos. O tratamento inclui medidas de suporte e o uso de etanol como antídoto, já que ele “compete” com o metanol pela enzima que o transforma em ácido fórmico.

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